Não me vou sem dizer isto…

O que tinha a dizer já disse é a hora de passar ao silêncio definitivo. Mas não me vou sem dizer isto. Tive em tempos esta coisa onde escrevo agora pela última vez que me serviu para satisfazer o vício da escrita. Nunca tive grandes pretensões com esta escrita, a não ser fixar um certo momento do dia ou da noite, um certo pensamento, uma certa irritação, um qualquer estado de espírito, o esboço de alguma coisa que me chamou a atenção.

No entanto, aconteceu por aqui muita discussão política, muita dela inútil porque não levou a lado nenhum, nem influenciou coisa nenhuma. Muita conversa animada, mas nada que tivesse relevância no correr dos dias. Nunca me fez diferença, porque sempre soube que ia ser assim. Mas um dia cansei-me do bolodório e o corpo também começou a falhar-me. Deixou de querer escrever e eu tive que lhe fazer a vontade. E o corpo manda muito nestas coisas da escrita.

Passei depois muito tempo a recuperar esta velha carcaça e comecei a ocupar-me de outras escritas. A ter mais cuidadado com a falência do corpo. Daí que tudo isto perdeu sentido. Depois veio também o facebook, por onde estou agora quando me apetece e o corpo deixa. Portanto, já nada disto me apetece ou interessa. Tutto è fatto.

Em nome de quê? Para quê? Porquê?

Em nome de quê? Para quê? Porquê? São perguntas que fazemos quando chega a hora do fim. Quando chega a hora de acabar com isto. Começando pela primeira. Em nome de quê? Em meu nome concerteza. Para quê? Para nada, apenas para opinar, para dizer alguma coisa, mesmo quando não havia nada para dizer, apenas para chatear. Houve mesmo quem ficasse chateado, quem não gostasse disto ou daquilo. Até um processo em tribunal. Mas tudo passou. Já ninguém se lembra. Porquê? Por nada. Porque me apeteceu, porque podia escrever, porque tinha tempo, porque tinha saúde, porque não tinha nada de útil para fazer, porque queria fixar os dias e o percurso que realizei durante esse tempo. Deixar qualquer coisa para visitar no futuro quando entendesse. Deixar um pouco das milhentas situações em que fui em que pensei isto ou aquilo. Mas um dia deixei de poder e acabou-se. Por vezes, tenho saudades, mas passam depressa. Não tenciono voltar.

O deslize

Os jornais sublinharam esta semana a gaffe do vice-primeiro-ministro britânico, Nick Clegg, que disse na Câmara dos Comuns que a invasão do Iraque tinha sido ilegal, mas poucos deram destaque à gaffe de David Cameron em Washington, ao dizer que a Grã-Bretanha tinha sido o parceiro menor dos EUA no combate ao regime nazi. O deslize mostra obviamente um certo desconhecimento histórico do que foi a Batalha de Inglaterra e o esforço que os ingleses fizeram para conter os nazis. Mas é grave vindo de um primeiro-ministro inglês.

Diálogo entre o Contribuinte e o Estado

Contribuinte – Gostava de comprar um carro.
Estado – Muito bem. Faça o favor de escolher.
Contribuinte – Já escolhi. Tenho que pagar alguma coisa?
Estado – Sim. De acordo com o valor do carro (IVA)
Contribuinte – Ah. Só isso.
Estado – E mais uma “coisinha” para o por a circular (IUC)
Contribuinte – Ah!
Estado – E mais uma coisinha na gasolina necessária para que o carro efectivamente circule (ISP)
Contribuinte – Mas sem gasolina eu não posso circular.
Estado – Eu sei.
Contribuinte – Mas eu já pago para circular.
Estado – Claro.
Contribuinte – Então vai cobrar-me pelo valor da gasolina?
Estado – Também. Mas isso é o IVA. O ISP é outra coisa diferente.
Contribuinte – Diferente?
Estado – Muito. O ISP é porque a gasolina existe.
Contribuinte – Porque existe?
Estado – Há muitos milhões de anos os dinossauros e o carvão fizeram petróleo e você paga.
Contribuinte – Só isso?
Estado – Só. Mas não julgue que pode deixar o carro assim como quer.
Contribuinte – Como assim?
Estado – Tem que pagar para o estacionar.
Contribuinte – Para o estacionar?
Estado – Exacto.
Contribuinte – Portanto pago para andar e pago para estar parado?
Estado – Não. Se quiser mesmo andar com o carro precisa de pagar seguro.
Contribuinte – Então pago para circular, pago para conseguir circular e pago por estar parado.
Estado – Sim. Nós não estamos aqui para enganar ninguém. O carro é novo?
Contribuinte – Novo?
Estado – É que se não for novo tem que pagar para vermos se ele está em condições de andar por aí.
Contribuinte – Pago para você ver se pode cobrar?
Estado – Claro. Acha que isso é de borla? Só há mais uma coisinha…
Contribuinte – Mais uma coisinha?
Estado – Para circular em auto-estradas
Contribuinte – Mas eu já pago imposto de circulação.
Estado – Mas esta é uma circulação diferente.
Contribuinte – Diferente?
Estado – Sim. Muito diferente. É só para quem quiser.
Contribuinte – Só mais isso?
Estado – Sim. Só mais isso.
Contribuinte – E acabou?
Estado – Sim. Depois de pagar os 25 euros acabou.
Contribuinte – Quais 25 euros?
Estado – Os 25 euros que custa pagar para andar nas auto-estradas.
Contribuinte – Mas não disse que as auto-estradas eram só para quem quisesse?
Estado – Sim. Mas todos pagam os 25 euros.
Contribuinte – Quais 25 euros?
Estado – Os 25 euros é quanto custa.
Contribuinte – Custa o quê?
Estado – Pagar.
Contribuinte – Custa pagar?
Estado – Sim. Pagar custa 25 euros.
Contribuinte – Pagar custa 25 euros?
Estado – Sim. Paga 25 euros para pagar.
Contribuinte – Mas eu não vou circular nas auto-estradas.
Estado – Imagine que um dia quer…tem de pagar
Contribuinte – Tenho de pagar para pagar porque um dia posso querer?
Estado – Exactamente. Você paga para pagar o que um dia pode querer.
Contribuinte – E se eu não quiser?
Estado – Paga multa

O pacto de silêncio

Há tempos, o Presidente da Mesa da Assembleia Municipal teve que mostrar um cartão vermelho a um deputado socialista chamado Pedro Vaz. É um caso raro na nossa assembleia, mas pode acontecer quando as pessoas esticam a corda.

A história conta-se em poucas palavras e mete além do deputado em questão, um vereador do mesmo partido chamado Fernando Mendonça, candidato a Presidente de Câmara nas últimas eleições. É um pequeno caso da política local que fica mal aos dois eleitos, mas que não podia deixar passar em branco, porque é um caso típico de desrespeito pelas instituições e pelas pessoas.

Em primeiro lugar, há um deputado na assembleia municipal chamado Pedro Vaz, líder da bancada do PS, que ainda não encontrou o registo certo e que nem sempre contribui, pela sua diligência, para o bom correr dos trabalhos da assembleia. Por diversas vezes e em situações de vária ordem tem sido advertido pelo Presidente da Mesa para respeitar os trabalhos da assembleia. O deputado em questão tem uma certa tendência para os apartes constantes, para a interrupção das pessoas quando estão no uso da palavra. Era escusado ser assim, mas é uma mania que tem.

Na última reunião no período em que se estava a discutir a informação escrita do Presidente da Câmara decidiu falar da política dos mega-agrupamentos escolares, quando isso não estava na informação escrita do Presidente da Câmara. E decidiu para responder a uma intervenção minha, feita no período antes da ordem do dia sobre esse assunto. Portanto, estava claramente a desviar-se do assunto em discussão violando o nº2 do artigo 33 do regimento da assembleia. Foi advertido pelo Presidente da Mesa, mas não quis saber e ainda tentou embrulhar a mesa dizendo que o assunto estava de certa forma contido na informação escrita. O Presidente da Mesa não gostou e ao abrigo do artigo 33 retirou-lhe a palavra. Ora o deputado Pedro Vaz reagiu mal, levantou a voz em tom de desafio e começou a perguntar que artigo é que o Presidente da Mesa estava a usar para lhe tirar a palavra. O Presidente da Mesa em tom de voz igualmente pesado disse-lhe para voltar para o seu lugar e que de seguida lhe dizia o artigo, mas numa atitude de nítido afrontamento, o deputado recusou-se a voltar ao lugar, enquanto o Presidente não lhe dissesse o artigo em questão. Perante a recusa, o Presidente da Mesa foi obrigado a suspender a reunião, mas o deputado insistiu em não voltar ao lugar. Nunca tinha visto tal coisa em Estarreja. Estava a reunião suspensa, quando vereador Fernando Mendonça do seu lugar decide intervir para dar cobertura ao comportamento do deputado dizendo que o que se estava a passar era uma vergonha e que tudo aquilo parecia uma ditadura. Lamentável a intervenção do vereador em questão, não só por dar protecção a um comportamento inaceitável por parte de um deputado, como também como factor de perturbação da própria assembleia e de desrespeito da Mesa. O vereador não sabia claramente do que estava a falar e teve um comportamento pouco digno perante a assembleia. E com a conversa da ditadura, saiu da sala mais o deputado em questão. Pouco depois, alguns deputados do PS receberam um sms para abandonarem também a sala, coisa que não foi seguida por grande parte deles. Mas a atitude mostra uma vontade de continuar a querer perturbar o correr dos trabalhos.

Ora tudo isto era escusado se as pessoas prezassem o regimento da AM e acatassem com respeito as decisões do Presidente da Mesa. Se o Presidente da Mesa tivesse cometido algum erro (o que não foi o caso), o deputado em questão podia sempre recorrer da decisão nos termos do regimento. É assim que funciona a democracia, não é com birras, ainda por cima, com pessoas com especiais responsabilidades públicas. Agora o que também é pena no meio deste episódio é que o partido que apoia estes dois eleitos tenha vindo fazer barulho em comunicados por causa de um pequeno caso da política local.

Ao fazê-lo quis alimentar a birra do deputado e atacar o Presidente da Mesa com ofensas perfeitamente gratuitas. O mais espantoso é que há uma exigência para que o Presidente da Mesa se retrate, quando quem se devia retratar era o deputado em questão e o vereador pelo comportamento que tiveram. Ora parece que agora em protesto, os deputados socialistas adoptaram um pacto de silêncio e que não falam mais até ao fim do mandato. Ou seja, também decidiram fazer uma birra. Obviamente que estão no seu direito de não falar e não virá daí mal ao mundo. Agora se não falam o que é que estão a fazer na assembleia? Em tempos, a líder do PS local disse que no último mandato os deputados do PS tiveram que fazer de conta que eram muitos, pois efectivamente eram poucos numericamente. Agora parece que estratégia mudou. O objectivo é fazer parecer que não são nada. Qualquer dia já ninguém dá por eles. E é pena, pois até há pessoas válidas dentro daquele grupo.

(In Jornal de Estarreja)